| Reforma Tributária: O que esperar do Split Payment Simplificado? Por Lucas Moreira* A Proposta de Lei Complementar (PLP) 68/2019, que propõe uma reforma tributária estrutural no Brasil, introduzirá mudanças significativas no sistema de arrecadação e fiscalização de tributos. Entre os diversos dispositivos contidos nesse projeto, o art. 51 trata de um tema relevante para os prestadores de serviços de pagamento e os sujeitos passivos do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS): a segregação e o recolhimento dos tributos incidentes sobre as transações financeiras realizadas por meio de arranjos de pagamento.
O § 8º do art. 51, em particular, estabelece um procedimento simplificado para a apuração e o pagamento desses tributos, que se aplica a operações que não geram direito a crédito para o adquirente. Neste artigo, será abordado o conceito do procedimento simplificado de pagamento, as condições para sua adoção e as implicações para o contribuinte e os prestadores de serviços de pagamento, com base no texto da PLP 68/2019. O contexto do art. 51 da PLP 68/2019
O art. 51 da PLP 68/2019 regula a obrigação de segregação e recolhimento do IBS e da CBS por parte dos prestadores de serviços de pagamento, em transações que envolvem esses tributos. Esse procedimento visa garantir que os valores devidos a título de IBS e CBS sejam identificados, segregados e pagos ao fisco de forma eficiente, com a colaboração dos prestadores de serviços financeiros. A principal inovação trazida por esse dispositivo está na possibilidade de split payment, ou seja, a divisão do valor da transação entre o prestador de serviços e o fisco, no momento da liquidação financeira. A ideia é que, ao realizar uma transação de pagamento, o prestador de serviços de pagamento (como as operadoras de cartão de crédito ou fintechs) segmente o valor do tributo incidente (IBS e CBS) e o repasse ao fisco, conforme o estabelecido no regulamento. Do Procedimento Simplificado
O § 8º do art. 51 oferece uma alternativa ao complexo processo de segregação e recolhimento do IBS e da CBS, permitindo ao sujeito passivo optar por um procedimento simplificado de pagamento para todas as operações que não conferem direito a crédito ao adquirente. Em outras palavras, para as transações em que o adquirente não pode utilizar os tributos pagos (IBS e CBS) como crédito fiscal, pode ser adotado um procedimento mais simples, sem a necessidade de calcular o valor exato de cada tributo incidente sobre a operação. Esse procedimento simplificado será regulado pelos seguintes parâmetros: a. Percentual Pré-Estabelecido De acordo com o inciso I do § 8º, o valor a ser segregado e recolhido pelo prestador de serviços de pagamento será calculado com base em um percentual pré-estabelecido. Esse percentual será fixado pelo Comitê Gestor do IBS (para o IBS) e pela Receita Federal do Brasil (RFB) (para a CBS). O objetivo desse percentual é simplificar a apuração e o recolhimento, sem a necessidade de cálculo exato do tributo sobre cada transação. b. Implicações do Percentual O inciso II do § 8º esclarece que o percentual será aplicado independentemente do valor efetivamente incidente de IBS e CBS sobre a operação. Ou seja, o contribuinte não precisará calcular a base de cálculo real de cada transação, bastando aplicar o percentual fixado. Essa simplificação busca reduzir a carga administrativa e aumentar a previsibilidade para os prestadores de serviços de pagamento, que poderão realizar o recolhimento de forma mais ágil. c. Irretratabilidade da Opção O § 8º também estabelece que a opção pelo procedimento simplificado será irretratável para o período em que for escolhida. Ou seja, uma vez optado por esse regime simplificado, o contribuinte não poderá voltar atrás durante o período de apuração a que a opção se refere, o que implica em uma certa rigidez para aqueles que decidirem adotar esse modelo. A Regulação do Procedimento Simplificado
A adoção do procedimento simplificado está condicionada à definição de percentuais específicos para o IBS e a CBS, que serão estabelecidos de forma conjunta pelo Comitê Gestor do IBS e pela RFB. O § 9º do art. 51 traz as seguintes considerações a respeito da fixação dos percentuais: - O percentual será uniforme para o IBS e para a CBS, sendo vedada a aplicação de simplificação para apenas um dos tributos; e
- Este percentual poderá ser diferenciado por setor econômico ou por sujeito passivo, a partir de uma metodologia de cálculos previamente divulgada. Essa flexibilidade possibilita que diferentes setores da economia ou contribuintes com características específicas possam ter percentuais ajustados à sua realidade tributária.
Além disso, o § 9º, inciso II, aponta que os percentuais poderão ser diferenciados entre os setores econômicos, considerando a diversidade de operações tributadas e os diferentes impactos da reforma tributária sobre cada setor. Responsabilidade e Utilização dos Valores Recolhidos
O § 10 do art. 51 estabelece que, mesmo com a adoção do procedimento simplificado, o sujeito passivo permanece responsável pelo pagamento dos tributos nos termos dos artigos 48 e 49 da PLP 68/2019, que regem a apuração e o recolhimento mensal do IBS e da CBS. Já o § 11, por sua vez, trata da utilização do valor recolhido. O valor pago por meio do procedimento simplificado será primeiramente utilizado para saldar eventuais débitos pendentes de IBS e CBS relacionados às operações vinculadas. Caso o valor recolhido seja superior ao necessário para cobrir essas pendências, o excesso poderá ser utilizado para compensar débitos de períodos anteriores ou, na ausência de débitos, será devolvido ao contribuinte em até 3 dias úteis. Considerações Finais
O procedimento simplificado de pagamento, previsto no art. 51, § 8º da PLP 68/2019, oferece uma solução eficiente e prática para o cumprimento das obrigações tributárias relativas ao IBS e à CBS, especialmente para operações em que o adquirente não tenha direito a crédito, como nas vendas diretas a consumidores finais. A fixação de um percentual pré-estabelecido para a apuração e o recolhimento do tributo representa uma redução significativa da complexidade administrativa e uma importante ferramenta para a simplificação do sistema tributário. Entretanto, a irretratabilidade da opção e a necessidade de adaptação aos percentuais definidos pelo Comitê Gestor do IBS e pela RFB exigem planejamento e atenção por parte dos contribuintes. Com isso, pois mais que a reforma tributária prometa trazer simplificações, ainda será indispensável o acompanhamento de uma consultoria jurídica especializada, de modo que os contribuintes estejam preparados para as iminentes mudanças, como forma de evitar riscos fiscais e vislumbrar possíveis oportunidades. *Lucas Moreira é Advogado e Consultor Tributário, com especialização em Impostos Indiretos e integra o time de Conteúdo da Systax.
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